Desembarque - parte II

Morte aqueles que morto me deixaram.

Fogo aqueles da carnificina que cheiraram.

Podre são os corações dos sonhadores,

Podre são as palavras,

Verdadeira é a dor.


Morte aqueles que me incumbiram de sonhar.

Morram todos eles,

Aqueles que eu quero matar.


Desapareçam todos com tudo,

E toda a destruição que causaram.

Para mim hoje é tarde,

Mas foi a única tarde que tenho como verdadeira.


Eu vi a conspurcação,

A podridão de não sentir,

De não sofrer.

Sofro eu ser ignóbil,

Sofre aquele que não quis morrer.

Desembarque - parte I

Hoje o dia morreu,

Levando-me junto com ele.

Nos seus meandros entrelaçou-me,

Para depois me matar.


Nos seus ângulos mortos eu não vi,

Sucumbi por achar saber,

Nada soube.


Ilusões tornam em frustrações,

Que me arrastam e não me deixam levantar.

Hoje não arranjo um sentido,

São os demónios que quero expiar.


Fantasmas recentes que me corroem,

E me fazem tremer.

Hoje não quero acordar,

Somente desvanecer.

Cobertor

São as noites que custam mais a passar.
É o acordar tarde,
Mas ainda assim cedo para dormir.

É o sucumbir a espaços,
E emergir em palavras.

É ao dormir que tudo custa.
É ao sonhar que me perco,
E sinto que no acordar já não desperto.

Primavera entardecida

Hoje é primavera,

Onde o sol não impera,

Onde o vento corta corações que apenas batem.

Ora forte,

Ora fraco.

Limita-se ao “bac” do prato que cai no chão.

Limita-se a ser meia-luz,

No meio de tamanha escuridão.

Limita-me a parecer mas a nunca ser.

Dá-me a mais bela lua,

Com o outro lado do mundo a morrer.

Cisma parte II

Vejo com outros olhos,
Enxergo com dois olhares.
Não encontro a minha realidade.
Perco-me na vaidade de achar que tudo gira à volta da terra.
Da minha terra.

Ecoou a destruição,
A terra debate-se e nada a circunscreve,
Tudo serpenteia entre o cheiro cadavérico
E um poema.

Tudo se escreve no nada que quero dizer,
As palavras são as minhas visões deturpadas,
Quentes e frias,
Tórridas e geladas,
Mortas e vivas,
Escritas e faladas.
Palavras.
São meras palavras.

Cisma

É no entrecruzar com a realidade que me apercebo da mentira.
É ao acordar de tarde que me apercebo do que perdi de manhã.

Sinto que ser e estar só,
são opostos que convergem em mim.
Afogo-me nas verdades e iludo-me em fantasias.
Cicatrizes que tenho mas que teimam em abrir.

Quebro um pouco da dor que há lá fora e trago-a para dentro.
Bem dentro,
Ela perde-se
Ela esconde-se.
Mas ela vive e não me deixa escapar.

Ela ilude-me e teima em me lançar ao chão.
Chão frio e duro.
Duro como eu sou quando não quero ser.